Reflexão por um bispo emérito
A despedida do pastor e pai da Igreja Católica na Arquidiocese de Campinas foi marcada por muita emoção, pois o amor de Dom Bruno pela vida se expressava através do largo sorriso e da simpatia com que se dirigia às pessoas e Comunidades.
Uma morte, sem dúvida prematura. As doenças que o sugaram, não lhe tiravam a alegria e a disposição para o trabalho pastoral. Por inteiro se entregou à missão apostólica de confirmar na Fé seus irmãos pastores e as Comunidades da sua querida Igreja Arquidiocesana. Nada o detinha em seu zelo pela missão. Um belo exemplo de dedicação e generosidade.
A sua memória e o seu testemunho não nos impedem, porém, de refletir sobre o cuidado com nossa saúde e, quem sabe, nos conduzir ao reconhecimento de que a mobilização das preces pela sua recuperação poderia ter sido precedida de uma nova postura ou de uma nova cultura em família, na sociedade e na própria Igreja sobre o nosso modo de viver e de comer.
Em nossos dias cresce a consciência da importância de uma alimentação saudável, adequada e solidária para atender às exigências de nossa vida e vocação.
Não se trata de um problema estético, mas uma questão ética. A miséria e os males da fome atentam contra a vida humana e cassam a própria cidadania. Saúde, vigor, inteligência, criatividade e bom humor, são dádivas divinas alimentadas por oxigênio, água, ternura, frio e calor, pelos frutos da terra e da cultura alimentar partilhados na mesa da fraternidade e da amizade.
Alimento é vida. Alegra-me pensar que a vida é um processo permanente de alimentação que se inicia com a fecundação até atingir a plenitude no Reino de Deus. Ninguém é concebido e dado à luz para viver uns poucos dias, pois segundo o profeta Isaias (c.65), a morte de alguém com menos de cem anos de idade seria considerada prematura! Encanta-me, segundo a visão de Zacarias (c.8), imaginar pessoas muito idosas e felizes numa praça em que brincam crianças cheias de vigor!
A Eucaristia que celebramos em nossas Igrejas é o sinal mais perfeito do Reino de Deus em sua plenitude. Por outro lado, a família em volta da mesa é sacramento da Igreja e da própria democracia. Em qualquer tempo, reunir as famílias em volta da mesa é caminho da evangelização. Ao redor das mesas, em nossas casas, alimentamos o corpo, a alma e o espírito. Em volta da mesa, no pluralismo dos ritmos da vida, de gênero e de idade; com os alimentos da sabedoria, do acolhimento e do diálogo; com o pão e o vinho, com as frutas, legumes e cereais, formam-se pessoas e firmam-se alianças.
Na mesa da família não há excluídos e nem famintos, as diferenças são valorizadas e a igualdade garantida através da partilha dos bens e dos dons.
A mesa da família nos prepara e dispõe para tomar assento à Mesa do Reino, em que transformados em filhas e filhos de Deus celebraremos por todo o sempre o Banquete da Vida em Comunhão.
Alimento é Caminho da Paz. A superação da miséria e dos males da fome conduz à paz e à preservação do Planeta, segundo nos ensina o Papa Bento XVI (Encíclica Caridade na Verdade, 27).
Ingente e desafiadora tarefa garantir que haja pão em todas as mesas e que ninguém coma sozinho. Mais, ainda, que ninguém durma com fome e com raiva, sem pão e sem perdão!
Com esta reflexão gostaria de manifestar solicitude e solidariedade a esta Igreja em que, bispo católico e peregrino, encontro uma pousada. Serei sempre grato a Dom Bruno, ao Padre Francisco e à sua Paróquia de Santa Rita de Cássia, em Indaiatuba, pela acolhida ao meu trabalho em defesa e promoção do direito humano ao alimento e à nutrição, a fim de que nenhuma criança morra criança vítima da miséria e da fome.
Embora com limitação de tempo e de recursos, mas contando com parceiros qualificados, também é meu propósito contribuir para que padres e bispos, cultivando uma nova espiritualidade em nossas relações, vivamos de forma mais saudável a partir da mesa partilhada na fraternidade. Afinal, o Povo Santo de Deus alegra-se com o amor de seus pastores e espera que sejamos vigorosos e bem humorados!
Em minha peregrinação, caminho animado pela Palavra anunciada por Isaías (c.58): “Quando repartires teu bocado com o faminto, tua luz brilhará”. Brilhe o Sol da Justiça e reine a Paz sobre nós.
Indaiatuba, SP, 03 de Setembro de 2011
Dom Mauro Morelli Bispo Emérito da Diocese de Duque de Caxias, RJ
Presidente do CONSEA-MG
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