sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Salve a República ou....Quilombo do Brasil ! (III)

Salve a República ou... Quilombo do Brasil? (III)

Inaugurando novo ciclo de cidadania em busca de uma Nação constituída no respeito às diferenças e comprometida estruturalmente com a defesa e promoção da igualdade, volto a publicar a proposta apresentada ao Movimento Nacional Constituinte (Como fazer nova a República – DMM – Coleção Fazer VOZES/IBASE 1985).
                                                                        * * *

“Com a monarchia ou sem ella deve a gente de cor ter ingresso na prosperidade do Brasil”.
(Arruda Câmara. Revoluções Pernambucanas – 1817-1824)

Na aurora de um novo Brasil, vejo nas Nações indígenas os primeiros cidadãos deste país e nos povos de raça negra os maiores construtores de nossa riqueza. Vergonhosamente, os filhos da América e da África foram os mais destruídos e explorados, sujeitos à discriminação e marginalização. Dos primórdios da história da pátria, até nossos dias, milhões de indígenas e africanos, e seus descendentes, são vitimas dos maiores crimes cometidos na terra de Santa Cruz! No rigor da palavra e com crueldade desumana, os indígenas, quase varridos do cenário nacional, e os negros, aviltados e esmagados, pelo genocídio brasileiro.

Não haverá reconciliação, neste país, sem reparação às nações indígenas e aos povos da bela e grande raça negra.

Na pregação da soberania da Nação sobre o Estado e na organização da Sociedade, a justiça e a fraternidade continuarão lesadas, se aos filhos de Tupã e aos cidadãos de raça negra não se reconhecer e assegurar o direito incontestável, por muitos títulos, a uma vida digna e livre. Em comum com as outras raças, o titulo por excelência da dignidade humana. Em segundo lugar, na história da pátria, o peso do seu sofrimento e a contribuição inestimável dada à cultura e ao processo do Brasil. Por último, no balanço da democracia, aos primeiros cidadãos das terras brasileiras, deve ser devolvida a natureza e definido o espaço sagrado em que possam não apenas sobreviver, mas atingir a grandeza da vida; aos cidadãos de raça negra, imensa maioria da Nação, igual oportunidade de participação no pacto social, na proporção de seu número e do seu valor.

No coração desta carta aos brasileiros, sobre as bases de uma Nova República, coloquei a UTOPIA DOS QUILOMBOS, englobando nela as TABAS DOS TUPINIQUINS, como sinal de gratidão, gesto de reparação e fraternidade e fonte de transformação.

O índio não é vergonha, nem atraso do Brasil! As suas cores são o verde e o amarelo da Bandeira Nacional. Destruir o índio é golpear profundamente o Brasil, no peito. Sua cultura preserva a vida, enriquece a humanidade. Sua extinção significa, além disso, pôr em risco o equilíbrio ecológico de toda a terra.

Igualmente, não se entende, nem se faz o Brasil sem o negro. Sem o negro não será autêntico o pacto social da Nova República. Não se renova o Brasil sem a energia da negritude.

Não há povo tão massacrado, que revele tanta vitalidade, indomável resistência e tão fecunda criatividade. A raça negra, na história do Brasil, se revela fonte inesgotável de energia.

A gente negra, na herança dos quilombos africanos e na saga heróica dos quilombos brasileiros, oferece a toda a Nação a Mística da Libertação, o protótipo e caminho da construção de uma pátria livre, justa e fraterna: o Quilombo do Brasil!

“Quilombo, palavra derivada da língua Kimbundu da África Austral, significa comunidade, no mais elevado sentido: comunidade em solidariedade, em convivência e comunhão existencial” (Abdias do Nascimento).

Na utopia dos quilombos brasileiros, nas tapas dos Tupiniquins, Tamoios e Guaranis, encontro a raiz mais profunda das saudades da Candelária!

No Quilombo do Brasil, queremos vestir o rei e cobrir a nudez do povo. O tecido não será importado, mas produto da sabedoria e da capacidade da Nação.

A terra abençoada por colheitas abundantes, alimentando a vida de todos os habitantes, jamais será possuída pela cobiça do capital, seja no campo ou na cidade. De imediato, 200 milhões de hectares da terra agrícola, tomados como investimento por algumas poucas mãos avaras, serão desapropriados em favor de toda a Nação. Quanto aos outros duzentos, da mesma forma profanados, terão o mesmo destino social.

O trabalho jamais fará escravos, mas será sinal de participação da gente livre da Nação. Por sinal, proclamaremos o primado da pessoa e do trabalho sobre o capital. Por esta razão, a extorsão cometida do mercado financeiro e os juros escorchantes serão eliminados da politica econômica do Quilombo do Brasil. O bem da comunidade, a justiça e a probidade, a soberania e a liberdade dos povos, serão critérios para os negócios dentro e fora de nossas fronteiras.

Por questões de religião ou pensamento, cor de pele ou grau de instrução, idade ou sexo e estado civil, ninguém será lesado em seus direitos de cidadão do Quilombo do Brasil.

O luxo desmedido e a indigência desprovida, frutos da ganância que faz escravos e desrespeita a própria natureza, serão combatidos por uma justa distribuição de bens.

Garantiremos trabalho para todos, estabeleceremos fundos para os desempregados e, em questão de salários, faremos um pacto social: ninguém recebe menos do que um e ninguém leva mais do que três!

Para não cansar o rei, primeiro ministro, presidente ou generais, nos processos decisórios faremos política e eleição. Garantiremos a participação de todos:
_ na produção;
_ nos progressos da ciência e da técnica;
_ na cultura e no lazer; e
_ na propriedade dos meios de produção.

No mundo em que vivemos, queremos ser o quinto maior produtor de arados e de alimentos.

Buscando sempre a paz, não queremos ser escravizados pela ordem constituída e nem pelo progresso que marginaliza a maioria da Nação.

Não seremos muito exigentes, no Quilombo do Brasil, apenas desejamos cobrir a nudez do povo e vestir o rei ou presidentes.

No Quilombo do Brasil, a Fé que une os brasileiros na variedade das línguas, louvando o único Senhor e Deus, exclama na prece de saudação dos irmãos: Saravá!

Belo Horizonte, 18 de novembro de 2011

+Mauro Morellli , bispo católico e peregrino


terça-feira, 15 de novembro de 2011

Salve a República ou ...Quilombo do Brasil? (II)


Partilho  em meu "blog" nova reflexão sobre a comemoração da Proclamação da República, no contexto de dois grandes e recentes eventos nacionais. A IVª Conferência Nacional de Segurança Alimentar Nutricional Sustentável e o 5º Congresso Brasileiro de Extensão Universitária, realizados na semana de 07 a 11/11, em Salvador e Porto Alegre, respectivamente. A pacificação da Rocinha e adjacências oferece-me a moldura perfeita para a  exposição das provocações e propostas.

Neste novo texto estou editando e completando respostas dadas a algumas questões que tem sido levantadas com frequência nos últimos anos. Por primeiro, procuro responder às indagações sobre a diferença entre meu trabalho como bispo da diocese de Duque de Caxias e agora  peregrinando tempo integral a serviço da defesa e promoção do direito humano ao alimento e à nutrição. Num segundo momento, minha visão da realidade sofrida da Baixada Fluminense. Em terceiro lugar, meu posicionamento sobre o tratamento do Governo Lula à segurança alimentar. Por último, quais caminhos somos desafiados a percorrer nesta década para alcançar objetivos inadiáveis para um novo milênio com saúde e paz.

I -  Atuação como bispo na diocese e na peregrinação pelo direito ao alimento e à nutrição

A tarefa principal de um bispo é evangelizar e sua principal ocupação, cuidar da Igreja para que seja a presença humana e histórica de Cristo Pastor. Como João Batista, a Igreja é uma lâmpada, não é a Luz; a voz, mas não a Palavra. Oportuna e inoportunamente anuncia o Reino de Deus, um Reino de Verdade e de Vida, de Justiça e de Paz. A exemplo de Maria, anuncia que o olhar de Deus pousa sobre os pequenos e fracos, seus prediletos. É vocação da Igreja, como testemunha do Senhor Jesus, o exercício permanente da misericórdia. Estar junto aos míseros e sofredores para que se levantem e caminhem com dignidade e esperança.

Durante vinte e quatro anos caminhei na Terra Santa da Baixada Fluminense. Como bispo fundador da Diocese de Duque de Caxias procurei levar a Boa Nova da dignidade humana a um povo violentado em seus direitos e humilhado de tantas formas. Por toda a parte clamei contra o extermínio. Além da formação das Comunidades e de seus pastores e catequistas, eram minhas prioridades a criação e formação de novas Comunidades e apoio às associações e movimentos populares. Ao iniciar a diocese, contávamos com noventa e cinco comunidades católicas. Ao entregá-la ao segundo bispo, somavam duzentas e trinta e três.

Realizamos um grande mutirão para resgatar crianças da desnutrição que impede o desenvolvimento integral da pessoa. Chegamos a quarenta mil crianças com rosto, nome e endereço.  Nosso trabalho foi integrado no relatório do Prof. Jean Ziegler, relator da ONU para o direito humano ao alimento e à nutrição. Em conseqüência fui convidado a integrar o Comitê Permanente de Nutrição (SCN-UN), tendo sido designado como promotor de nutrição do mesmo SCN.

A participação na luta contra a miséria e os males da fome, desde março de 1993, levou-me a todos os recantos do Brasil, dificultando meu trabalho na diocese. Após longo processo de  recuperação de grave acidente em 2003, roguei ao papa João Paulo II para me liberar do compromisso  com a diocese para me dedicar tempo integral à causa da defesa e promoção do direito humano ao alimento e à nutrição.

Assim, desde 2005, sou um bispo católico e peregrino a serviço dessa causa com presença em vários Estados Brasileiros, especialmente Minas Gerais, São Paulo,  Paraná, Pernambuco e Baixada Fluminense, dialogando com Universidades, com o Poder Público e com os Movimentos Sociais para que o direito ao alimento e á nutrição seja conhecido, reconhecido, exigido e vivido.

Segundo o papa João Paulo II, isto acontece se houver uma orquestração da ação da família, da sociedade em sua composição tão rica e diversa e dos Governos, em todos os níveis. Em meu trabalho enfatizo sempre que o meio ambiente é determinante; o direito, fundamento; a saúde, razão de ser; e, a criança, menina dos olhos.

Segundo o papa Bento XVI (Encíclica Caridade na Verdade - 29/06/2009) o combate à fome e à exclusão social é um imperativo ético para a Igreja. Quem se dedica a esta causa, está contribuindo para a preservação do Planeta e a promoção da Paz. Assim, considero-me fiel à missão que me foi confiada como bispo, embora não esteja a serviço de uma Diocese. Não é fácil tarefa a evangelização centrada na defesa das fontes da vida e na promoção do direito humano ao alimento e à nutrição. Com meu trabalho missionário, estou cuidando do que é mais precioso no Evangelho: a pessoa humana! Que uma criança não morra criança, a razão de ser de minha vida e do meu trabalho (cfr. Isaias, capítulos 65 e 58).

Tenho me dedicado à promoção do direito. Fui o articulador da primeira lei estadual (MG) e das primeiras leis municipais de segurança alimentar e nutricional sustentável.  Trabalho  em diálogo com um bom número de  Universidades, pois fome e miséria não serão vencidas sem educação e mudanças radicais em nossos hábitos e costumes. Sociedade e governos trabalham como se a questão social fosse um problema de “caridade” e de assistência.

Doravante busco direcionar meu tempo e energias para comunicação e educação à distância, a partir do Centro de Evangelização João Paulo II, em Indaiatuba, SP, em parceria com várias universidades. Oportunamente espero editar e tornar público escritos que, desde 1975, relatam os passos dados e caminhos percorridos em meu pastoreio, até o presente. Com os mesmos objetivos e com o mesmo espírito espero continuar peregrino nos dias de minha vida.

II - Visão da Baixada Fluminense 



Um retrato em preto e branco do Brasil. Até 1964, sua vocação foi o serviço de abastecimento e de lazer da metrópole. Após 1964, vindos de todos os recantos do país, nela os migrantes forçados pelo modelo de desenvolvimento imposto pelo  Golpe de Estado, foram se aninhando ao lado dos “beneficiados” pela Lei Áurea.

Em verdade, morros e alagados foram a porção “destinada” ao povo negro descartado pela ordem econômica, em nova etapa de dominação dos recursos naturais e de exploração do trabalho humano.

Como ocorre nestes dias, novas ocupações não resolvem o grave problema social e ambiental que transforma a Baixada Fluminense, a Zona Norte Carioca e outras regiões metropolitanas em “Coroa de Espinhos” da Cidade Maravilhosa, outrora soberba capital do Império e da República. 

Enquanto os pobres forem criminalizados pela sua pobreza, as ocupações não passarão de exercício de prepotência e de “controle social” em benefício  dos turistas e dos que efetivamente gozam de cidadania.

Não se resolve o problema da miséria (não da pobreza) enquanto houver concentração de riqueza.  Aliás, a riqueza não vive sem a miséria, sua filha bastarda. A riqueza e a miséria desfiguram o ser humano!  Ser pobre é viver como gente, com dignidade e cidadania, sem esbanjar e sem acumular nada. Não há paz sem justiça. As ocupações dos morros do Rio, sempre repercutem na Baixada. Os “bandidos” que escapam do Rio, de forma violenta ocupam outros espaços.

Em 12/12/10, estive em Jardim Amapá, para celebração que mantém viva a memória do massacre de uma família em 1988. Um casal, estando grávida a esposa, e três meninas. No local do massacre, ergue-se hoje a Comunidade Nossa Senhora dos Mártires, com um belo santuário e centro de formação. Naquela celebração também clamamos contra extermínio de jovens encurralados numa sociedade sem rumo e sem justiça. Somente no ano de 1989, mil e cem pessoas sofreram morte violenta nos municípios de Duque de Caxias e São João de Meriti.
O Estado do Rio de Janeiro sofre de grave crise de identidade em sua relação com a porção ocupada  pela Cidade do Rio de Janeiro! Em verdade, nas campanhas políticas fica evidente a primazia da Cidade Maravilhosa.

Nem a Igreja Católica se entendeu bem com a população do Estado. O próprio episcopado do Estado quase sempre é importado de outras regiões, sinal da "imaturidade" da Igreja na região (pelo menos, na visão do poder central). A Igreja nunca acertou os passos com a evangelização do povo negro. Aliás, o desafio para a Igreja em qualquer lugar é o dialogo respeitoso com as diferentes culturas. Evangelho é Luz e Fermento, não uma superposição cultural.

O Rio de Janeiro, com mais pessoas sem religião declarada do que a soma de todos os “evangélicos”, caracteriza-se pelo sincretismo religioso, pelo hedonismo e pelo pluralismo de opções que dariam sentido e norte para a vida humana.

Neste contexto, sem querer pecar contra a caridade, as classes dirigentes e políticas, com honrosas exceções,  causam-me espanto e, às vezes, asco. Contudo, continuo enamorado pelo povo carioca e fluminense, tão pluralista, malicioso e paciente, assim plasmado na escola da sobrevivência. O “malandro” é um sobrevivente altamente qualificado num território em que a cidadania sempre foi privilégio de uns poucos.

A Baixada Fluminense é Terra Santa, banhada pelo sangue derramado de tantos inocentes e pelo suor de mulheres e homens madrugando para um dia de trabalho desqualificado pela ganância de quem acumula riqueza. A cor branca é passaporte nas noites dessa região em que mais da metade da população é de raça negra.

III- Ação do Governo Lula

O Lula não foi ditador e nem traidor como alguns afirmam, por preconceito ou por desencanto. Não chegou à presidência por um golpe de estado e nem por uma revolução, mas pelas alianças dos partidos políticos que tutelam a população e pelas elites que controlam os meios de comunicação e a economia do país. Haja vista a aceitação do mercado financeiro e do mundo empresarial, os principais beneficiários dos méritos do Governo Lula. Mesmo a Bolsa Família, se não resolve o problema familiar da fome gerada pela exclusão, sem dúvida aquece o mercado local!

A Bolsa Família é a principal resposta do Governo Lula ao problema da fome. Válida como medida de assistência social, expressa o principal enfoque com que o problema dos males da fome foi tratado pelo Governo Lula.  Reafirmo que não é uma questão de caridade e nem de assistência social. No seu governo a coordenação das respostas a um direito básico estavam confiadas ao Ministério de Assistência Social ou de Desenvolvimento Social.

Os dados divulgados por organismos com IBGE e IPEA, contradizem as afirmações do Governo e do próprio presidente em seu último mês de mandato. Não é verdade que cada um dos brasileiros e brasileiras tem garantidas as três refeições por dia! “O Brasil mudou tanto. Ninguém mais passa fome neste país” – ouvi esta a firmação da boca de uma pessoa muito querida e de comportamento ético, sentada a meu lado numa viagem aérea. Como se tratava de alguém com “status” de ministro, fiquei estarrecido e clamei por misericórdia divina, com medo que o avião sofresse um acidente.

IVª -  Objetivos e Metas do Milênio - nova etapa

Passaram-se os anos de FHC e de Lula, a renda continua centralizada de forma escandalosa e alimento continua sendo transformado em moeda ou “commodity”. Sem equacionar estas questões continuaremos sofrendo a degradação ambiental e o acirramento da questão social.
O que está em jogo é o modelo de desenvolvimento, como denunciva o Movimento pela Ética na Politica. A Lei Federal 11.947/09, uma das grandes medidas do presidente Lula, abre caminho para profundas transformações. A partir de cada micro bacia ou região, o Brasil se desenvolve produzindo alimento saudável, adequado e solidário para o Programa da Alimentação Escolar.

Hoje, um programa grandioso e simbólico, ao mesmo tempo. Porém, se a escola continuar sendo a referência e não o estudante, o programa não vai garantir a formação de uma nova geração inteligente, vigorosa e criativa, pois devidamente alimentada e nutrida. Centrado no estudante, o programa deve atender 100% das necessidades nutricionais do ser humano, não apenas 30%; garantido nos 365 dias do ano, não apenas em 200 dias escolares. Não há educação sem nutrição e vice-versa, um binômio indissolúvel.  Eis um grande desafio para a nova Presidente, o Congresso Nacional, Estados e Municípios, com a participação das famílias e da sociedade.

Com o binômio educação e nutrição, como nova opção para o desenvolvimento, o Brasil poderá iniciar gloriosa etapa de sua história. Escolhe a vida, Brasil. Alimento é vida e caminho da paz.  Nenhum objetivo do milênio se concretiza sem o alimento que nutre a vida.
Alguns pressupostos para superar o quadro de indigência e de exclusão devem ser considerados como exigências fundamentais da cidadania e da democracia. 

Libertar o povo brasileiro da "praga" do analfabetismo, é condição "sine qua non". O analfabeto corre o risco de exploração econômica, social, política e, mesmo, religiosa.
Com grande atraso, empreender revisão profunda do sistema latifundiário e novo direcionamento para a política agrária e agrícola.

Solução imediata, de baixo custo e de grandes benefícios (sociais, econômicos...) para o drama secular da titulação das terras devolutas urbanas e rurais. Outros documentos e títulos são fundamentais para o exercício da cidanania em nossa cultura e para atender a burocracia.
Cumprimento efetivo das diretrizes da política nacional de alimentação e nutrição, especialmente o monitoramento nutricional da população e o controle sanitário dos alimentos.

O caminho anunciado por Josué de Castro em sua profecia exige o cumprimento dos objetivos e metas do milênio. Em 2015, o número da famintos deveria estar reduzido pela metade segundo decisão da Cúpula Mundial de Alimentação, em 1996. Objetivo não atingido. Pelo contrário, ultrapassa a cifra de um bilhão,  o número das víitmas dos males da fome em todo o mundo.

Retomo proposta apresentada no texto anterior para as universidades, movimentos sociais, instituições religiosas e outras instituições de participação em defesa da vida com qualidade e dignidade. 

Vamos caminhar para um grande encontro em Belém, em 2013. Iremos definir conteúdos e intensificar preparativos para a grande VIGÍLIA da NAÇÃO, na noite de 15/10/2015.

Amanheceremos nas praças, na manhã de 16/10/2015, Dia Mundial da Alimentação, para clamar pelo direito humano básico ao alimento e à nutrição, com denúncias e propostas para um Pacto Social que faça de nós uma Nação em Estado constituida.
Salve a República ou ... Quilombo do Brasil?!



Indaiatuba, SP, 15 de novembro de 2011
+Mauro Morelli, bispo católico ou peregrino



segunda-feira, 14 de novembro de 2011

Salve a República ou ... Quilombo do Brasil! (I)




Neste 15 de novembro recorda-se o 122º aniversário do feito realizado pelo marechal alagoano no Largo da Santana, na capital do Império do Brasil.

Teria Deodoro proclamado a república ou apenas consumado um golpe de Estado? Não sendo historiador não teria autoridade para firmar de modo peremptório que de fato nada mais do que um golpe de Estado teria ocorrido.

Caminhando entre os pobres das periferias metropolitanas, em meu longo pastoreio, e participando do Movimento Nacional Constituinte, após a derrocada da ditadura implantada pelo Golpe de Estado de 1964, muitas coisas fui aprendendo sobre as transas, manhas e artimanhas da política brasileira.

Muito aprendi também como agente público de segurança alimentar e nutricional sustentável em 1993-1994 e de 1999 até o presente. Sem  esquecer que por quatro anos fui promotor de nutrição do Comitê Permanente de Nutrição da ONU (SCN-UN)

Por razões de justiça e gratidão, devo recordar, outrossim, as sessões de análise de conjuntura do IBASE, a convite de Betinho, como preciosa introdução à compreensão do Estado Brasileiro com seus objetivos e amarras.

A formação do Estado Brasileiro não é fruto de um pacto social e político de clãs e tribos que se aglutinam em Nação ao longo de um processo histórico que culmina com a constituição do  Estado e escolha de governantes visando o bem comum.

O Estado Brasileiro desde o século XVI foi criado e mantido por uma elite, não mais de 25 % de toda a população, comprometida e envolvida pelo emaranhado das relações econômicas internacionais, ora denominadas globalizadas e globalizantes.  

O Estado Brasileiro pode ser comparado a um luxuoso supersônico com apenas vinte e cinco lugares. Setenta e cinco por cento dos povos do Brasil não têm assento neste engenhoso assombro. A burocracia, elaborada e complexa, impede o exercício pleno da cidadania para essa imensa maioria, mesmo tendo conseguido conquistas incorporadas à estrutura do Estado, tais como alguns ministérios e secretarias especiais. O Estado brasileiro é esquizofrênico, bem como seus governos.

Na Terra da Santa Cruz, como Colônia, Província, Império, República Nova ou Velha, Estado Novo ou Ditadura, permanece sempre o mesmo Estado controlado por elites insaciáveis, insensíveis, insensatas e insanas, comprometidas com modelos econômicos e projetos de desenvolvimento que sempre lhes trouxeram benefícios e lucros em detrimento das populações do mesmo território e do saque das riquezas naturais e graves danos ao meio ambiente.

Assim como os males da fome atingem o espírito, a  estrutura mental e as relações sociais; a opulência, gerada pela ganância, embota o espírito, angustia a alma e causa muitas doenças, sendo a demência a mais grave delas!

Ao escrever esta reflexão recordo o memorável discurso de Frei Caneca, na Câmara Municipal de Olinda, devolvendo a Dom Pedro I a sua "Constituição outorgada". Aprendi com Frei Caneca que a Nação cria e estrutura o Estado para garantir o bem comum. Pela mesma razão, a Nação elege seus servidores, jamais senhores ou senhoras. 


Josué de Castro

Junto aos mangues do Recife, Josué de Castro, outro notável pernambucano e grande profeta, formulou a Geografia da Fome, sua gênese e seus males. Nos alagados da Baixada Fluminense, depois de noviciado ao lado de Dom Paulo Evaristo na Paulicéia, fiz a síntese entre Fé e Política, ou seja, libertar-se da escravidão e viver a cidadania. A mesma santa e justa indignação brilha nos olhos desses profetas e mestres da vida com dignidade e liberdade.

Retornando do 5º Congresso Brasileiro de Extensão Universitária, ousaria propor que boa empreitada para o próximo congresso seria a leitura crítica de nossa história para fazer justiça aos índios e negros, em primeiro lugar, mas também aos homens e mulheres que clamaram por vida com justiça, dignidade e liberdade  ao longo de cinco séculos.

Como foi anunciado, em Belém do Pará, estuário da Amazônia, em 2013, estará congregado o 6º Congresso Brasileiro de Extensão Universitária. A inquietação latente no seio das universidades poderá aflorar e se transformar na PROFECIA DE BELÉM.

A profecia é resultante da inquietude e indignação que brotam da leitura crítica da realidade. Ao mesmo tempo, a profecia revela a indignação  da denúncia e o clamor da esperança apontando caminhos.

Quanto discurso ofensivo à dignidade dos povos indígenas e africanos. Quanta criminalização de movimentos e insurreições que ousaram desafiar o poder clamando por liberdade e justiça. Entre tantos, os Quilombos e as Revoluções Pernambucanas, nos séculos passados, e as vítimas das aberrações do século vinte que, ainda, perduram nesta segunda década do novo milênio.

Garantido a ferro e fogo pela Lei de Segurança Nacional, implantou-se um modelo de desenvolvimento que se caracteriza pela concentração de renda, produção volumosa de grãos, extração e exportação de riquezas minerais; com as sequelas da exclusão social, degradação ambiental, miséria e fome.

Não nos esqueçamos que a história da presença humana neste espaço do planeta, hoje demarcado pela Repúbllica Federativa do Brasil, é muito mais antiga do que uns poucos séculos. Descobertas arqueológicas demonstram que seres humanos curtiam a vida por essas bandas há mais de trinta e cinco mil anos. Entre outras indagações, ousaria mesmo perguntar se alguém acredita que Deus iria aguardar a chegada de Cabral e de Frei Henrique para se entreter com seus fllhos que por primeiro habitaram estas belezas?

No encerramento do 5º CBEU, congregado em Porto Alegre, de 8 a 11/11/11, convidei os participantes a  definir sua vocação e missão empreendendo uma jornada de diálogo com os movimentos sociais e os povos do Brasil.

Iniciando-se em Porto Alegre, caminharíamos até Belém, como primeira etapa. A partir de Belém, com agenda delienada, seguiríamos percorrendo trilhas e veredas, lagos e igarapés, até a GRANDE VIGÍLIA DA NAÇÃO, na noite de 15/10/2015, para amanhecer em nossas praças em todos os recantos e rincões desse imenso Brasil, no dia 16/10/2015, Dia Mundial da Alimentação, anunciando um novo pacto social e a convocação de uma Assembléia Constituinte. Vai raiar a liberdade nos horizontes da esperança!

Naquela data esgota-se o prazo para o cumprimento do compromisso assumido pelos governantes presentes na Cúpula Mundial da Alimentação, em 1996, na cidade de Roma. "Até 2015,  tudo faremos para reduzir pela metade o número de famintos no mundo"Asssim pactuaram. Na época, 800 milhões; portanto, 400 milhões. A FAO divulgou recentemente, que ultrapassamos a cifra criminosa de um bilhão de famintos.

Quais seriam as propostas da IV Conferência Nacional de Segurança Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, realizada em Salvador, de 7 a 10/11? Não quero crer que tenha sido um mero festival abrilhantado por bolhas de sabão. Nem a presidenta compareceu; assim como FHC, em 1996. Revelador o artigo transcrito no boletim da Unisinos: Quem tem medo da Dilma?

Caminhemos ... de tranco em tranco, sem perder a esperança e a alegria de viver.

Itaicí, 14 de novembro de 2011

+Mauro Morelli, bispo católico e peregrino



















domingo, 6 de novembro de 2011

Matutando ... a caminho de Salvador (3)




Acompanho com preces e votos de paz e bem a quem está a caminho de Salvador para a IV Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Por uma opção consciente, viajo em direção inversa rumo a Porto Alegre, mas com os mesmos objetivos e sentimentos. Em Salvador, como na segunda e terceira conferências em Olinda e Fortaleza, teria pouco espaço para contribuir com uma reflexão crítica e formulação de propostas.

Desde a primeira hora do lançamento da Ação da Cidadania para a Superação da Miséria e da Fome e pela Vida, dedico-me à defesa e à promoção do direito humano básico ao alimento e à nutrição através de processos educativos e mobilizadores; bem como, à formulação de leis e de políticas públicas.

Desde 2005, com dedicação exclusiva, renunciando ao encargo de Bispo da Diocese de Duque de Caxias, tornei-me peregrino para que nenhuma criança morra criança por causa da miséria e da fome.

Como articulador do CONSEA-MG, alegra-me a presença da delegação mineira e gerazeira em Salvador.  Em 1999, com Itamar Franco, Governador em Minas Gerais, foi retomado o processo interrompido em 1995, por FHC.

A convite, de 8 a 11 de novembro, em Porto Alegre, participo do 5º Congresso Brasileiro de Extensão Universitária. Com o tema "As Fronteiras da Extensão" dirigentes, professores e acadêmicos das universidades públicas e particulares de todo o país, se encontram para proclamar a relevância da extensão em sua relação indissociável com a pesquisa e o ensino.

Fico imaginando como seria bom para nosso país um encontro dos intitutos de ensino superior com representantes dos povos do Brasil.

O convite que me foi feito é expressão de um teimoso e esperançoso diálogo com o mundo universitário nos últimos anos. Cabe-me a honra e a responsabilidade de ministrar a conferência na sessão de encerramento do congresso. Com humildade e ousadia, falando com o coração, desejo refeltir sobre a " Extensão Universitária em confronto com a Miséria e a Fome no século XXI".

Em Porto Alegre ou em Salvador, Josué de Castro, o insuperável profeta nordestino, deve ser ouvido para que se aprofunde nossa convicção que alimento é vida e caminho da paz.

Com Josué de Castro e com o Movimento pela Ética na Política, reflitamos sobre a corrupção e iniquidade de um modelo de desenvolvimento concentrador de riqueza e gerador de degradação ambiental, de miséria e dos males da fome. O problema não é acabar com a pobreza!? Antes que seja tarde, busquemos uma nova ordem para esta república e um novo rumo para o progresso.

Ao mesmo tempo, em que nos alegramos pelo caminho percorrido e pelas conquistas decorrentes desse direito básico e decisivo para tudo o mais, depois que somos dados à luz neste planeta, tenhamos a capacidade de definir objetivos e metas, com seus indicadores, para que os povos do Brasil se libertem da indigência que conduz a sofrer os males da fome.

Com denunciava Josué de Castro, nada atinge tanto o ser humano quanto a fome. Atua no espirito, na estrutura mental e nas relações sociais. Vejam o horror das guerras nas favelas do Rio e em outras regiões metropolitanas. Aliás, a opulência também embota o espírito, angustia a alma e gera muitas doenças.

Urgente que o Governo Federal, muitos Estados e Municípios, ultrapassem as estruturas assistenciais das ações de governo, para prevalecer e resplandecer o direito como fundamento das políticas públicas. O respeito ao meio ambiente é determinante.

 A sociedade e as religiões também precisam evoluir da compaixão e da "caridade" para a cultura do direito, da justiça e da solidariedade. Seja nosso grande objetivo ver o povo brasileiro vigoroso, inteligente, criativo e bem humorado.

Não queiramos inventar a roda para a superação da miséria e dos males da fome. Nutrição e Educação, eis o binômio indissolúvel indicador do caminho. Escola de tempo integral e um novo programa brasileiro que garanta a quem estuda alimentação e nutrição em cada um dos 365 dias do ano.

O alimento deve ser saudável, adequado e solidário, como direito reconhecido e garantido para cada ser humano que nasce ou vive em nosso Brasil. Mulheres e homens, pobres e ricos, santos e pecadores, crianças e jovens, adultos e idosos comamos e bebamos para viver. Criança não morra criança e a morte aos cem anos seja considerada prematura, cumprindo-se asssim a profecia de Isaias (c.65).

Com urgência, porém, alguns pressupostos para a superação da miséria e dos males da fome devem ser enfrentados. Entre os principais, a erradicação do analfabetismo, a revisão profunda da estrutura latifundiária e a titulação das terras devolutas  urbanas e rurais, dentro de um novo projeto de desenvolvimento para o país. Entre tantas medidas, o fortalecimento e a primazia do Ministério do Desenvolvimento Agrário e do INCRA.

Quem tem ouvidos para ouvir, ouça! Paz e Bem. Com os Estados estrangulados por uma impagável dívida com a União; muitas outras coisas, como um novo Pacto Federativo, poderiam ser ditas e certamente o serão. 

Indaiatuba, SP, 6 de Novembro de 2011


+Mauro Morelli, bispo católico e peregrino